Dispositivo que facilita digestão de material orgânico em laboratório rende nova patente para a UFC
Para estudar amostras orgânicas em laboratório ‒ como frutas, legumes e carnes ‒ a química analítica utiliza técnicas a fim de reduzir a massa dessas amostras, preparando-as para análise. A técnica mais comum é a digestão, na qual uma porção é tratada com ácidos oxidantes ou misturas ácidas, e depois submetida a altas temperaturas. Com isso, elementos inorgânicos, como sódio, potássio e cálcio, por exemplo, ficam disponíveis na forma de solução (mistura líquida e homogênea), prontos para serem analisados.
Pesquisadores do Departamento de Química Analítica e Físico-Química da Universidade Federal do Ceará, em parceria com o Departamento de Química da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), desenvolveram um dispositivo e um método inovadores, que tornam esse processo de preparação mais rápido e eficiente. O invento acaba de ser reconhecido pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), resultando em mais uma patente para a UFC ‒ a oitava da Instituição.
De acordo com o Prof. Sandro Thomaz Gouveia, um dos pesquisadores que assinam a patente, métodos de preparo de amostras são muito estudados na Química. Isso porque a estratégia adotada deve garantir a integridade da composição e a representatividade dos constituintes na amostra, e, ao mesmo tempo, deve tornar esses elementos disponíveis em solução para a análise química.
Atualmente, os procedimentos mais rápidos requerem equipamentos de elevado custo, além de formação de recursos humanos aptos para sua utilização. Com a nova patente, a ideia é ampliar as possibilidades de investigação em laboratório e reduzir os custos das análises.
COMO FUNCIONA ‒ “A patente em questão propõe uma etapa prévia de digestão, na qual massas maiores de amostras são tratadas, inicialmente usando um dispositivo com aquecimento eficiente (radiação infravermelha), para reduzir o teor da massa inicial da amostra e, com isso, possibilitar uma pré-concentração (aumento da concentração dos elementos a serem analisados), viabilizando o uso de instrumentos de análise de menor sensibilidade e baixo custo”, explica Gouveia.
Com a etapa de pré-digestão, há um aumento de até três vezes da quantidade de amostra que pode ser analisada de uma única vez. Sem essa fase inicial, a amostra a ser analisada se limita a 0,25 grama. Com o dispositivo, que utiliza uma lâmpada de radiação infravermelha para otimizar o aquecimento, é possível fazer uma digestão total de até um grama de amostra a cada vez, sem exceder as limitações de pressão dos frascos de laboratório.
O trabalho com massas maiores resulta em maior sensibilidade e, consequentemente, em mais precisão e exatidão nas análises por técnicas instrumentais. Isso significa a possibilidade de verificações mais confiáveis, mesmo quando se tratam de elementos químicos presentes em baixas concentrações (ou menores quantidades).
Ouça também matéria sobre o dispositivo produzida pela rádio Universitária FM
APLICAÇÃO ‒ “Esse dispositivo é de baixo custo, podendo ser facilmente implantado. A utilização de elevadas massas de amostras é a grande inovação, tendo em vista que essa é uma limitação para outros procedimentos de tratamento de amostras descritos na literatura. Além disso, permite que possam ser empregadas técnicas de baixa sensibilidade para alguns elementos da tabela periódica”, acrescenta a Profª Gisele Simone Lopes, que também assina a patente.
Segundo a pesquisadora, o dispositivo e o método têm potencial para ser empregados tanto na pesquisa científica (em análises laboratoriais) como em laboratórios comerciais ou industriais (no controle de qualidade de insumos, processos e produtos, por exemplo). A aplicação é voltada principalmente a amostras orgânicas de origem animal e vegetal.
Enquanto aguardavam a concessão da patente, os pesquisadores trabalharam no aperfeiçoamento do dispositivo, ajustando-o a demandas específicas. No Laboratório de Estudos em Química Aplicada (LEQA) da UFC, onde foi desenvolvido, o equipamento já vem sendo empregado na realização de pesquisas, sendo objeto de estudo de alguns trabalhos de mestrado e doutorado, inclusive com publicações científicas em periódicos internacionais.
A PATENTE ‒ A carta-patente, cujo pedido foi depositado no INPI no fim de 2012, tem como titulares a UFC, a UFMG e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG). Além do Prof. Sandro Gouveia e da Profª Gisele Lopes, assinam o invento a Profª Wladiana Oliveira Matos, também da UFC, e os seguintes professores da UFMG: Frank Pereira de Andrade, Letícia Malta Costa e Clésia Cristina Nascentes.
O projeto contou com financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e da FAPEMIG.
“A concessão dessa carta-patente é uma grande conquista para todos os envolvidos no projeto, bem como para nossas unidades acadêmicas, o Departamento de Química Analítica e Físico-Química de UFC e o Departamento de Química da UFMG. E serve de estímulo a todos nós para que possamos alcançar outros patamares com as pesquisas desenvolvidas”, diz a Profª Gisele Lopes. “Não podemos deixar de reconhecer que essa notícia, vinda nesta atual conjuntura em que nos encontramos, é um sopro de esperança e ânimo para a realização de nosso trabalho”, completa o Prof. Sandro Gouveia.
TEMPO DE INOVAÇÃO ‒ Essa é a oitava patente concedida à UFC desde setembro de 2019, quando a primeira carta da história da Instituição foi concedida pelo INPI.
As recentes aquisições são resultado de esforço exercido pela Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação (PRPPG), por meio da Coordenadoria de Inovação Tecnológica (UFC Inova), que tem trabalhado para facilitar os registros, no INPI, das invenções desenvolvidas na UFC. Durante a pandemia de covid-19, a UFC Inova iniciou um tipo de mentoria com os inventores de patentes que estão passando por exames técnicos, analisando aspectos da redação patentária e orientando, através de e-mails, reuniões pelo Google Meet, dentre outras formas, sobre o atendimento aos requisitos legais vigentes no País.
Por Robério Santo
Fontes: Prof. Sandro Gouveia (e-mail: stgouveia@gmail.com) e Profª Gisele Lopes (e-mail: gslopes@ufc.br), ambos do Departamento de Química Analítica e Físico-Química da UFC